Capítulo III | Love Behind Betrayal

em quinta-feira, fevereiro 16 | Nenhum comentário:
Tentava despachar-me o mais depressa que conseguia, tencionando que me sobrasse ainda pelo menos uma meia hora para estar com a Wendy antes de ir trabalhar. Mexia-me atarefada, tentando concentrar-me somente no fogão, acabando de preparar os bolinhos de arroz. Enquanto isso, pelo canto do olho, ia observando a minha filha, completamente embrenhada nos seus trabalhos de casa, fazendo de vez em quando apenas uma pausa para ir à mochila buscar mais um lápis ou simplesmente se levantar para ir até ao lava-loiça buscar um copo de água. Olhei para o relógio depois de ter terminado de confeccionar o nosso almoço. Ainda me sobravam uns 20 minutos...
Fui buscar um copo de água quase 3 minutos depois de ela o ter feito – pelo menos pela 4ª vez só naqueles 30 minutos – e fiquei a observá-la, a escrever debruçada sobre o seu caderno da escola. A Wendy era extremamente boa aluna – uma das melhores da classe, por sinal – e era frequente os professores chamarem a atenção para o facto de ela se relacionar muito com os colegas da sala, ajudando-os nas actividades e tudo mais. Eu, claramente, era uma mãe babada com tudo isto e ficava incrivelmente feliz ao ver que a Wendy se esforçava tanto por manter as boas notas e fazer muitos amigos, além da grande ajuda que me dava ali em casa, apesar de ficar sozinha durante tanto tempo ao longo do dia.
Olhava-a com o mesmo sorriso radiante já há uns bons momentos, despertando quando a vi largar o lápis e fechar o caderno.
– Acabei! – Empunhou os braços no ar como se desse um viva tamanha era a alegria que esse simples facto poderia trazer-lhe e olhou-me com um sorriso doce, depois. Não disse nada, pelo menos até sentir o pêlo da nossa gatinha branca roçar-lhe nas pernas, pedindo atenção. – Oh, olá Charlés...
Pousei o copo de novo no lava-loiça, em silêncio. A voz da Wendy chegava para encher aquela cozinha, aliás, aquela casa de felicidade, mesmo estando ela sozinha numa das divisões. A leveza e doçura do sorriso dela eram absolutamente contagiantes.
– Estive ocupada a fazer os trabalhos de casa mas sabes que mais? Agora já tenho um tempo para brincar com Vossa Excelência, Madame! – Não consegui conter-me a esboçar um sorriso divertido ao ouvi-la falar assim. Ela olhou-me, em seguida, de volta ao seu tom normal e sereno, que me transmitia tanta calma. – O que foi, mamã?
– Nada. – Limitei-me a responder. Notei-a a encolher os ombros nas minhas costas antes de ligar o rádio na estação local. A Wendy adorava música, passava horas a cantar e a imaginar melodias. Às vezes, acho que ela até adormecia a murmurar algumas notas. Eu achava piada a essa tendência artística dela. Conhecia alguém que costumava tê-la há 7 anos atrás.
Foi uma questão de segundos até eu me virar e dar com ela a cantar como uma verdadeira artista, simulando-se em cima de um palco quando apenas se achava sentada na mesma cadeira, tendo como público apenas os seus cadernos, lápis e folhas, bem como uma gata persa branca que a encarava assustada de olhos arregalados. Além de mim, é claro.
Não consegui evitar uma gargalhada.
Kawashita hazu no nai yakusoku ga kyou mo bokura no mirai o ubaou to suru... – Vi-a olhar-me antes de se levantar para vir ter comigo, puxando-me pela mão para que a seguisse até ao meio da cozinha, antes de desatar aos saltos. Cantava sem parar, na sua voz fina e esguia. – Hoshigatteita mono o te ni shitemo... Sunao ni... Umaku waraenai no wa naze darou.
Afureru namida wa yowasa ya koukai janai itami ga unda kakera de...
Comecei a cantar com ela também sem dar por isso, as duas em uníssono, como num coro em pleno concerto de Rock.
Donna shunkan datte unmei datte hitotsu dake tashikana mono ga aru… To shitta... Hitori de kangaechatte ima o mayou yori ashita o... Mukae ni ikunda!
Dançávamos de mãos dadas como duas crianças, aos pulos no meio da cozinha. Ela saltava, gritava, cantava, tentava dar piruetas, tudo... Sem nunca me largar as mãos ou deixar de olhar para mim. Ao fim de alguns minutos, deixámo-nos cair exaustas no meio do chão. Fiz-lhe cócegas mal consegui recuperar do cansaço, fazendo-a rir à gargalhada, encolhendo-se para fugir do meu ataque antes de me abraçar novamente. Suspirei ao sentir a respiração quente dela perto do meu peito, mantendo-a abraçada a mim, protegida naquele lugar como eu costumava sentir-me com o pai dela, há 7 anos atrás.
– Adoro-te, mamã...
Só a abracei mais ao ouvir a vozinha dela, fazendo-a abraçar-me de forma mais apertada, tal como havíamos estado há um tempo, no meu quarto. Ela era... A única coisa que me restava. A única pessoa que eu ainda tinha. A única que eu sabia que sempre acreditaria em mim e compreenderia o que eu fazia. A única que nunca me viraria as costas, seguramente, houvesse o que houvesse. Que teria sempre uma palavra amiga para me reconfortar. Um abraço para me dar quando eu precisasse dele. A nossa filha.
Ficaria com ela ali durante o resto do dia, se pudesse fazê-lo. Ela sabia bem que eu não me importaria, que daria tudo para trocar aquele trabalho no supermercado por mais umas horas do meu dia com ela. Mas não era possível. O sustento e o bem-estar dela dependiam disso. Beijei-a na testa, adivinhando-lhe o sorriso. Ela riu-se depois, ao sentir o pêlo da Charlés roçar-se na sua pele de novo, quando a gata resolveu vir interromper o nosso momento, lançando-se para o meio de nós.
– Oh, Charlés, sua gata ciumenta e tonta! – Ralhou ela tentando parecer séria, mas sem conseguir fazê-lo no meio daquele enorme e encantador sorriso genuíno.
Acariciei-lhe os cabelos, apoiando-me na cadeira à minha frente depois para me poder levantar. Sem adiantar mais nada, ela limitou-se a fazer o mesmo, ficando a olhar-me com os seus olhos brilhantes e pequeninos – quase tanto como ela própria – como a um objecto de adoração. Sorri-lhe depois.
– O que foi, Wen...?
Não tive sequer tempo de terminar a pergunta. Os braços dela rodearam-me a cintura, voltando a abraçar-me com força, enquanto o seu rosto se escondia na minha barriga, devido à sua estatura baixinha. O meu sorriso aumentou um pouco, mas de uma forma mais triste. Acariciei os seus cabelos azuis escuros.
– Wendy vá lá... A mãe tem mesmo de ir. – Ajoelhei-me na frente dela, beijando-a na testa e na bochecha depois, olhando-a. – Ficas bem? Aguentas até a mãe chegar?
– Sim. – Respondeu ela, olhando um pouco para o chão. Depois, como se lembrasse de qualquer coisa extremamente importante de repente, olhou-me de novo com uma expressão chocada e, simultaneamente, feliz. – Mamã?
Olhei-a, estranhando.
– O que foi?
– É... É hoje, não é?
Fixei-a durante um tempo, tentando perceber onde quereria ela chegar com aquela pergunta. Hoje? O que raio é que...?
O meu coração disparou de repente quando me lembrei daquela data. 13 de Outubro...
Jellal...
– É hoje. Eu... Queria ir lá. – Disse ela, olhando-me muito mesmo em tom de súplica. – Mamã? Eu queria ir buscá-lo. Tu... Tu prometeste que quando o papá saísse da prisão iríamos ter com ele. Que estaríamos à espera dele. Nós vamos, não vamos? Eu... Eu sonhei com isso toda a semana, só que... Hoje de manhã esqueci-me. Por favor, mamã!
Engoli em seco, olhando o chão completamente em choque. Faziam exatamente 7 anos que ele tinha sido condenado. 7 anos que eu tinha cometido, de entre todos eles, o maior erro da minha vida. 7 anos que eu tinha descoberto que estava grávida. 7 anos que eu fora, para proteger o futuro da Wendy, forçada a viver aquela farsa, fingindo odiá-lo e deixando-o sozinho contra o mundo. 7 anos que eu tinha parado de ser feliz por completo.
7 anos...
... Que, se não existisse a Wendy, eu estaria morta.
– Eu... – Olhei-a nos olhos, reparando nos pontinhos brilhantes que ameaçavam correr-lhe pelo rosto. O meu coração batia a mil mas o dela parecia tão agoniado que deveria ter parado no tempo. Suspirei, forçando um meio sorriso em seguida, deixando que a minha mão lhe acariciasse as bochechas quentes, impedindo as lágrimas de caírem por elas ao fazer-lhe carinhos. – Ok. A mãe... A mãe vai pedir para sair mais cedo do trabalho e passamos as duas por lá. Que achas?
Ver o sorriso de felicidade com que ela me brindou em seguida antes de me abraçar novamente quase escasseou qualquer medo que eu pudesse sentir. Sentir o conforto que ela me dava, os seus mimos, a forma como tentava dar-me forças para continuar a viver, mesmo que inconscientemente... Tudo o que ela fazia por mim só naqueles poucos minutos, dava-me a oportunidade de notar o me receio um pouco menor. Ela transmitia-me calma. Esperança. Paz. As únicas coisas que só ele, um dia, me havia conseguido fazer sentir.
A minha filha estava crescida. Há já muito tempo que esquecera os recados habituais do género “não abras a porta a estranhos”, “não mexas no fogão”, ou “não saias de casa sozinha”. A Wendy já era esperta o suficiente para saber que todas essas coisas não deveriam ser feitas. Já era uma mulherzinha, compreendia com facilidade as boas e más acções. Mas existiam assuntos que até mesmo ela, com toda a sua inteligência e perspicácia, nunca poderia saber entender apenas com 6 anos e meio. Assuntos que poderiam chegar para magoá-la, para que ela se sentisse plenamente sozinha no mundo apesar de me ter a mim e ao pai, embora estivéssemos separados. Assuntos que eu, ao longo de todo aquele tempo, lutara para ela não soubesse, nem suspeitasse sequer.
Suspirei antes de beijá-la na testa, encaminhando-me em seguida para a saída. Ouvia o miar da Charlés à medida que me afastava, denotando também a voz da Wendy enquanto pegava nela ao colo. Ainda consegui vê-la acenar-me antes de fechar a porta de casa.

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- Capítulo II
- Catulo IV

Capítulo II | Love Behind Betrayal

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Acordei meio desnorteado com a azáfama do costume, ali. Todos os rapazes já se tinham levantado e estavam agora a arrumar os dormitórios, tendo sempre de deixar tudo limpinho até se poder ver reflexos no chão de mármore. Isto se queriam evitar castigos. Limpei a minha parte, arrumando o meu saco cama já roto nos fundos por eu já ser demasiado grande para ele e olhei em volta depois. Se alguém soubesse que eu tinha aquilo ali, nunca chegaria a entregar aquilo à respectiva dona. Sorri, pegando no pequeno embrulho, escondendo-o entre as minhas calças e a camisola. Óptimo, assim ninguém conseguia ver. Se tudo corresse bem, conseguiria dar-lhe o presente ainda antes do cair da noite.
– O que é que pensam que estão a fazer? Larga isso! Já! – Virei-me de imediato na direcção da porta, ao ouvir a voz forte do Brain ecoar, desde a sala até ali. De seguida, ouvi os gritos da Erza. Não… Não, por favor, naquele dia não!
Disparei escadas a baixo, até chegar à sala onde normalmente nos apresentavam às famílias. Ainda estava em processo de limpeza. Vi um presente, meio aberto, mais perto do sítio onde estava. Uns passos depois estava Brain, grande e opulento, agarrando a Erza pelos cabelos enquanto Simon a tentava soltar, praticamente pendurado no braço enorme de Brain.
– A culpa não é dela, fui eu que lhe ofereci. Por favor…
As súplicas dele foram sacudidas com um safanão, enquanto a outra mão procurava a bengala com que ele andava normalmente, não para se manter em pé mas para nos castigar. Não tive tempo de ver o corpo do Simon bater contra a parede. Apenas corri o mais que conseguia, atirando-me contra aquele enorme ser, fazendo-o largar a Erza com o impacto e desferir o golpe sobre mim. A cabeça de imediato me zuniu, enquanto sentia a zona da fronte do lado direito rebentar de dor. Algo quente me escorria por cima desse olho, contrastando com o frio que se espalhara pelo meu corpo. Perdi o equilíbrio.
– Jellal! Não… Jellal?!? – Tinha meramente uma vaga sensação da voz dela, que me havia amparado antes que a minha cabeça pudesse cair com estrondo no chão. Senti os passos de Brain aproximarem-se.
– Larga-o! Foi ele que se meteu à frente, logo é ele que vai apanhar pelos três. Ouviste? Larga-o!
Apesar das ameaças dele, foi sobre o corpo da Erza que eu senti a bengala cair. Todo o corpo dela tremia, tentando escudar o meu, enquanto eu, meio inconscientemente, tentava puxar também o dela para debaixo do meu. Ela não merecia aquilo. Nunca o havia merecido, e muito menos naquele dia… Eram os anos dela, ela fazia doze anos…

***
Sentia a mão dela na minha, enquanto a puxava pelos corredores frios e escuros do orfanato. Tentávamos não fazer qualquer barulho pois se fossemos apanhados ali… Muito provavelmente seria o fim para ambos. Segurei-a pela cintura quando chegamos a uma esquina, espreitando para o corredor o melhor que conseguia com um pequeno pedaço de espelho que tínhamos escondido. Não havia nenhuma luz… Sinal de que o caminho estava livre.
Algures, o relógio de pêndulo bateu a meia-noite. Senti a mão da Erza apertar mais a minha. Agora, eu tinha dezasseis anos. Tinha idade suficiente para sair do orfanato. E ia fazê-lo, levando-a comigo. Ela não aguentaria mais um ano, o tempo que faltava para ela também poder abandonar aquele local. Por isso, fugiríamos naquela noite.
Assim que conseguimos chegar ao último andar, abrindo a porta para o poeirento sótão, dei-lhe ambas as mãos puxando-a contra o meu peito. Mesmo no escuro e sem a poder ver era... Tão bom senti-la assim de novo nos meus braços. Senti a cabeça dela aninhar-se contra o meu peito, enquanto o pequeno pedaço de espelho na minha mão me devolvia o nosso reflexo. Os cabelos vermelhos dela eram a única coisa que se destacava contra o meu peito. Por cima do ombro dela, adivinhava-se um rosto que ainda não conseguia identificar como meu, devido à grande cicatriz com que tinha ficado. Por muito que eu tentasse esquecer aqueles anos que ali passara, aquela marca iria sempre lembrar-me deles. Por outro lado, lembrar-me-ia sempre de tudo o que tinha feito por ela.
Pois ela valia cada sacrifício.
Rocei devagarinho o meu rosto pelo dela, sentindo a pele suave dela contra a minha, tão áspera que nem parecia humana.
– Anda… Vamos embora daqui. – Abri o alçapão que dava para o telhado. A luz da lua-cheia iluminava por completo o recinto, fazendo reluzir o metal das escadas de serviço, por onde tinha planeado a nossa fuga. Ajudei-a a descer, indo de imediato atrás dela para garantir que chegaria a tempo, caso alguém nos apanhasse.
Tal não aconteceu. Só passados muitos quarteirões, que fizemos a correr o mais depressa possível, é que parámos de frente um para o outro. O enorme sorriso depressa deu lugar a gargalhadas de júbilo. As gargalhadas rapidamente passaram a lágrimas, por sabermos que nunca mais passaríamos por algo semelhante. Passei-lhe depois as mãos pelo rosto para lhe limpar as lágrimas, eu próprio ainda a lutar contra as minhas.
– Erza…?
– Diz…?
– Posso… Tentar uma coisa?
– A-acho que sim…
Respirei fundo tentando arranjar coragem. Levantei lhe o rosto muito devagarinho olhando a bem fundo nos olhos, baixando o olhar depois para a boca dela. Era bastante óbvio o que eu ia fazer... Mas pelo menos assim ela tinha tempo pra me rejeitar. Durante todos aqueles anos, toda a minha protecção tinha sempre uma base de sentimento por trás. Companheirismo passou a amizade. Amizade passou a carinho. Carinho passou a amor. Não tinha bem a certeza do momento em que tinha parado de a ver como uma criança e a tinha começado a ver como uma mulher. Uma mulher linda, pela qual eu daria a vida as vezes que fossem necessárias. Só havia um único problema…
Como é que se beijava?
Eu nunca o havia feito. Pelo que sabia, ela também não. Os primeiros toques foram de um simples roçar. Nenhum de nós sabia muito bem como começar. Mas nunca esqueci aquele primeiro beijo.

***
– Não o achas demasiado pequeno?
– Jellal somos só nós os dois. E não temos dinheiro para mais. – Senti a mão dela procurar a minha, entrelaçando os dedos. – Para começar, está óptimo assim. Se algum dia tivermos dinheiro para uma maior e a família começar a crescer, depois vemos de uma maior.
O sorriso espalhou-se pelo meu rosto, olhando o pequeno apartamento que tínhamos conseguido arranjar. Um simples T0, mas que para nós era mais um Ttudo. Era a nossa primeira casa. As primeiras semanas depois da fuga haviam sido tempestuosas. Quer de tempo, quer de ambiente entre nós. Havíamos sobrevivido por três semanas numa carrinha abandonada, comendo o que conseguíamos encontrar ou mesmo “pedir emprestado” de algumas superfícies comerciais. Havíamos discutido imenso, quanto à nossa futura fonte de rendimento. Ela estava disposta às maiores loucuras, para conseguir dinheiro para nos sustentar. Eu recusava-me a tal. Não era de todo machismo, como ela me acusara já algumas vezes. Eu não tinha problema nenhum que ela trabalhasse, que também contribuísse para a casa. Somente não queria partilhar o que já tinha feito meu com outros.
Eu arranjara uma solução. Arriscada e vendida em pequenos pacotes, mas estava a dar para o gasto. 
Após a primeira semana, fui considerado apto a vender para tubarões, e não apenas para peixes pequenos ou médios. Advogados, médicos, até juízes e polícias. Muitos nomes circulavam pelas minhas mãos antes de eu fazer os pacotes circularem pelas deles. Dos nomes mais soantes e mais necessitados, era Erik quem sempre me procurava, em vez de ser o contrário. Tendo Cobra como cognome, naquela altura em que estava ainda a começar mas já era famoso pela defesa de vários casos sórdidos, ninguém o conseguia associar a nada daquilo.
– Se não fosse por já estares embrulhado com quem estás, eu sugeria-te uma parceria, sabes? – Dizia-me ele, muitas vezes.
Um dia, pura e simplesmente deixou de aparecer. A polícia veio no lugar dele.

***
– Acorda, vá Fernandes. Já é de dia.
Abri os olhos, escudando-os depois, perante a luz intensa que entrava pelas grades. Respirei fundo depois ao olhar para o tecto. Já era de dia… Era o meu dia.
Ainda deitado no chão, procurei quem me acordara, encontrando a sua figura a olhar para mim pendurado nas grades. Tinha o cabelo cenoura mais espetado que o normal. Dirigia-me um sorriso amigável.
– Anda lá. Olha que eles ainda mudam de ideias, se te demoras muito. Gostaste assim tanto das instalações?
– Nem morto cá passo mais tempo. – Disse, sentindo a voz rouca por não falar há tanto tempo. Praticamente só falava sempre que o Agente Loke vinha ver de mim. Aprendera que falar de mais ali podia dar mau resultado. Por isso nunca pedira nada. Nem colchão para dormir, nem cobertores, nem almofada… Nada. Sabia bem o que teria de dar em troca.
– Então mexe-te. – Loke abriu-me a cela, esperando que eu vestisse as roupas que tinham ficado retidas como objectos pessoais. No fim, algemou-me para me poder levar pelos corredores.
Assim que chegámos à entrada da prisão, ele tirou-me as algemas, entregando-me um pequeno papel em mãos.
– Tenho a certeza de que ainda te lembras bem da morada… Mas é só mesmo para certificar. – Olhei para ele ao verificar a morada. Era… Ele apenas me piscou o olho. – Tem cuidado contigo. Aproveita o ar. Cheira a tua liberdade.

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- Capítulo I

Capítulo I | Love Behind Betrayal

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Virava-me na cama pela vigésima vez. Tentava, há horas, que os meus olhos se fechassem, sem saber como fazer frente ao vendaval no qual se tinha tornado a minha vida. Não conseguia pregar olho. Mirando o cenário em volta de mim, limitava-me a fixar o quarto deixando que a minha atenção se detivesse no relógio pousado em cima da cómoda. Eram mais de 4:00h da manhã.
Suspirei, esforçando-me por me levantar sem que os meus ossos doridos fizessem o mínimo barulho. Não tencionava que ele despertasse. Não tencionava que ele me visse sair porta fora, preferindo escapulir-me com a certeza de que apenas nos veríamos novamente na manhã seguinte. Porque... Eu já não queria olhar mais para a cara dele. Eu, simplesmente, tinha asco de ter de suportar o perfume, o toque dele. Não aguentava, sequer, o quanto ele me sufocava enquanto mantinha aquele braço imundo em volta do meu corpo, prensando-me na cama para me fazer ficar do seu lado. Não aguentava ter mais de fingir sentir alguma coisa por aquele homem que não fosse o nojo, o desprezo, a fúria.
Mas não era apenas com ele que eu estava furiosa. Estava furiosa com tudo, comigo mesma, com a própria vida que me calhara em destino viver. Odiava ter de pensar no quanto as coisas haviam mudado, no quanto o mesmo rapaz que eu sempre havia amado desde criança havia mudado. Ele já não era o mesmo. Deixara-se fazer uma das piores coisas que poderia ter feito, e, apesar de eu compreender que as razões dele pudessem ser as melhores, isso não lhe dava o direito de estragar a vida de inocentes para que conseguíssemos sobreviver. Eu não conseguia, então, perdoá-lo por conta disso. No entanto... O meu coração ainda pensava da mesma maneira.
Vesti-me em silêncio, não tentando acender a luz e pegando apenas nos sapatos e na mala para sair do quarto, rezando por tudo para que ele não me ouvisse. A minha coluna queixava-se a cada passo, a cada movimento que eu exercia tentando caminhar. Eu tinha jurado que iria protegê-lo. Tinha jurado que nunca o deixaria. Mas, naquele momento, era imperativo para a minha sanidade mental proteger algo diferente. Proteger a única coisa de bom que tinha restado a nós dois no meio daquilo tudo.
Era essencial que ele pudesse voltar. Eu precisava que ele pagasse pelo que tinha feito, não apenas para que ele próprio se sentisse em paz com a sua consciência mas também para que tivéssemos um futuro. Agora sim, as coisas iriam resultar. Só me custava ter de fingir que não o queria mais. Ter de manter aquela farsa que dizia a toda a gente – por vezes, até mesmo a mim – que ele não era o homem certo. Que ele me enojava, que estar perto dele me deixava quase doente. Eu podia estar a exagerar em toda aquela encenação, mas ela era crucial para que tivéssemos uma vida. Para que ele tivesse uma vida.
E agora, já não havia mais volta a dar. As coisas estavam encaminhadas, eu apenas teria de esperar que aquela separação não fosse dolorosa o suficiente para que ele nunca mais me procurasse. Teria de ter esperança que ele ainda me amasse, mesmo depois de todo o mal que eu lhe havia feito. Teria de confiar, incansavelmente, nos sentimentos que ele dizia ainda ter por mim. E teria de esforçar-me. Teria de trabalhar muito para manter as coisas em ordem até que ele pudesse regressar. Mas eu iria consegui-lo. Toda a vida tinha sido uma lutadora. Ele fora o responsável por eu me ter tornado uma mulher assim.
Deixei-me ficar à porta de casa depois, sentada nas escadas de cara escondida nos braços. Iria esperar o amanhecer ali, não conseguiria entrar naquele lugar de novo, sabendo que ele estaria sempre por perto, sabendo que as recordações dele iriam sempre ocupar aquelas paredes, aquelas divisões, aquele chão e aquelas janelas. Tinha a certeza que, depois daquela noite, não haveria a mínima chance de que ele voltasse a pisar aquela morada tão cedo. Mas eu ficaria sempre ali, mantendo-me à espera do regresso dele.

***
A porta da sala de audiências foi a última coisa que ouvi depois de sair, seguidamente a ouvir a sentença do juiz Não sabia como reagiria ao julgamento inteiro e, talvez ter comparecido naquele lugar, fosse a coisa mais horrível que eu poderia ter feito a mim mesma e a ele. A forma como ele olhava para mim... Como me dizia com os olhos que ainda me amava... Como me pedia desculpas por ter de nos fazer passar por aquilo aos dois... Tudo isso apertava o meu coração de tal forma que quase o obrigava a rebentar-me dentro do peito. Estar naquele lugar estava a dar cabo da minha luta. Estava a dar cabo da farsa que eu montara para que ele achasse que eu já não o queria mais.
Eu sabia que seriam os olhos dele que me levariam à ruína. Tinha ignorado prontamente os receios que me haviam surgido sobre ir até àquele lugar, sobre assistir aquela que iria ser a maior injustiça a que eu já comparecera na vida pois sabia perfeitamente que tudo o que ele havia feito, havia sido por nós. Por mim. Tinha ignorado tudo isso, apenas para ter a certeza de que, à parte de tudo, ali dentro ele teria direito a comida, a um tecto por muito imundo que fosse. Sorri falsamente perante o meu egoísmo enquanto as lágrimas me corriam cara abaixo. Quem era eu para o condenar a um destino como aquele? Como é que eu tinha sido capaz de uma tamanha traição macabra daquelas? Quando é que eu me tornara numa mulher tão desprezível e cruel assim? Eu tinha estragado a vida dele. Tinha estragado qualquer hipótese que viéssemos a ter de recuperar a nossa vida juntos. Tinha-me apercebido naquelas últimas horas ali dentro de que... Eu tinha apenas feito com que ele me odiasse. Com que qualquer réstia de amor, de carinho que ele achasse que eu merecia, eram perdidos através das minhas acções. Será que eu estava mesmo disposta a pagar aquele preço?
Desencostei-me da parede prontificando-me a regressar à sala, disposta a acabar com aquela farsa no mesmo instante. Dei uns dez passos, parando ao sentir o meu ventre levar um chuto. Travei-me a mim mesma, acariciando-o. Não. Eu não podia entrar ali. Onde raios estava eu com a cabeça? Eu ia estragar tudo. Ia fazer com que perdêssemos tudo. Ia... Oferecê-lo de bandeja a uma casa de adopção qualquer.
Acariciei a barriga só depois. As lágrimas ainda me corriam cara abaixo.
– Schh... Vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem, amor... A mãe está aqui. A mãe vai tomar conta de ti, sim? Até o pai voltar para nós, a mãe... A mãe nunca te irá deixar sozinha.
– Nunca... Nunca irei deixar-te sozinha...
Acordei aos poucos ainda totalmente ensonada, mexendo-me na cama para procurar o som daquela voz doce. O quarto estava quente e, debaixo daqueles lençóis e cobertores todos, eu conseguia distinguir no entanto aquele corpo pequenino, esguio e bem cheiroso. O corpo da nossa princesa.
– Já estás acordada, mamã? – Ouvi-a perguntar sempre na sua voz delicada muito perto do meu ouvido, fazendo perdurar as carícias que fazia nos meus cabelos com as suas mãos pequeninas.
– Hum... Já, mas se continuares a mimar-me assim, a mãe vai querer dormir de novo... – Suspirei, aninhando-me mais na almofada, chegando-me mais para o lado dela para a conseguir abraçar contra o meu peito. Senti o seu rosto prensar-se na curvatura do meu pescoço, antecipando a sua respiração calma e compassada que sempre me fazia sentir tanta serenidade mesmo em dias mais difíceis.
Também ela suspirou.
– Podias ficar em casa hoje... – Sussurrou ela. – Há muito tempo que não passas o dia comigo. Tenho saudades, mamã.
Quase me comovi totalmente ao ouvi-la parecer ainda mais sensível do que era costume aos meus ouvidos. Fi-la olhar para mim, acariciando-lhe os cabelos depois. Ela era a minha princesa. A princesa dele. A nossa princesa. E aqueles olhos dela, aqueles cabelos... Cada vez eram mais iguais aos do pai. Seriam essas algumas das razões que me faziam amá-la tanto?
– A mãe tem de trabalhar, amor. Sabes que... Temos de ter tudo pronto para quando o pai voltar. – Disse só baixinho esforçando-me para que ela me visse com um sorriso. – Eu prometo que... Mal as coisas se encaminhem e ele esteja de volta, nós... Nós vamos voltar a ser uma família. Vamos passar todo o tempo juntos. Prometo. Sim?
O sorriso dela abriu-se de felicidade, antecipando o abraço quente e apertado que me deu em seguida. Às vezes... Sentia que estava a ser cruel por estar a dizer-lhe algo assim sem ter quaisquer certezas de como o Jellal veria as coisas agora. Mesmo assim, ainda guardava uma secreta esperança de que ele viesse a perdoar-me e a aceitar a Wendy como filha dele. Não podia pedir-lhe que agisse como se nada houvesse acontecido mas podia sempre pensar que ele continuaria o mesmo homem que desejava mais que qualquer coisa ser pai, certo? Isso dava-me alento para dizer aquelas coisas à Wendy, mesmo que eu soubesse que poderia não ser tão fácil de encarar a realidade assim. Além de que ela ficava feliz. E ver o sorriso dela quando se falava do pai dela e de sermos uma família de novo, era o bastante para mim.
Vi a sua estatura esguia e leve soerguer-se da cama e calçar os chinelos antes de vestir o roupão cor-de-rosa que lhe tinha oferecido naquele último Natal. A sua expressão alegre dava pulos de contentamento enquanto ela me beijava na testa e se encaminhava para a porta numa correria quase louca de tão animada.
– Vou preparar-nos o pequeno-almoço!

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- Prólogo

Prólogo | Love Behind Betrayal

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Dei mais uma volta no chão, coberto com apenas um cobertor meio ratado das dentadas dos pequenos mamíferos que, de vez em quando, se alimentavam deles, quando mais não tinham do que comer. Olhava as enormes fissuras no tecto, por onde sempre pingavam gotas de cada vez que chovia. Outrora, talvez a cor do tecto tivesse sido esverdeada, tal como as paredes que me encarceravam. Agora, não passavam de uma mancha vazia e negra, que acompanhava a fenda, parecendo uma enorme boca que se ria, trocista, de mim. Tinha-o feito durante sete anos.
Mas isso mudaria no dia seguinte.
Senti as mãos tremerem, do nervoso miudinho. Tudo o que o polícia que tinha tratado do meu caso durante estes anos todos me tinha dito ainda revolvia na minha cabeça. Os nomes ecoavam-me pela mente, formando cada um, uma onda de imagens, como se tivesse atirado uma pedra para um lago. Erik... Erza... Wendy.
A última era a única de quem eu não tinha imagens definidas, por isso só podia imaginar. Nunca, não naquele lugar fétido, onde homens trocavam tudo o que tinham por um cobertor ou uma almofada e ali estavam fechados pelos mais diversos crimes, eu poderia ter sonhado que ela existia. Ela era minha filha... E eu não soubera da existência dela durante sete anos.
Lembrava-me, claro como água, daquele dia.
Lembrava-me do cheiro a papel antigo que preenchia a sala de audiências onde eu havia sido julgado. Lembrava-me do cheiro a cabedal carcomido da cadeira onde eu fora algemado, sem direito a dizer uma única palavra em minha defesa. Só agora eu sabia que esse meu silêncio tinha sido comprado pelo meu próprio advogado. Ele próprio fizera de propósito para perder o caso, para o nome dele não ser envolvido num escândalo onde ele estava metido até à raiz dos cabelos.
Lembrava-me dos olhos da Erza, quando o juiz me condenou a sete anos de prisão, por posse e tráfico. Ela olhava para mim como se eu tivesse cometido a maior atrocidade do mundo, como se a tivesse ofendido no mais íntimo do seu ser. Eu tinha-lhe explicado, mas parecia que ela não tinha compreendido. Nós estávamos sem dinheiro, após quinze anos de abusos num orfanato, de onde eu a salvara. Nós estávamos sem dinheiro, pois tudo o que tínhamos amealhado havia sido usado para alugar aquele pequeno apartamento, que quase nada tinha além de um colchão. Nós estávamos sem dinheiro, sem emprego, sem formação no que quer que fosse... E eu não ia deixar que ela fizesse do corpo uma maneira de arranjar sustento.
Não tinha orgulho de ter feito o que fiz. Mas nunca me arrependi de tal. Fitando o tecto, fechei os meus punhos, lembrando-me como ela se levantara e saíra da sala de audiências sem dizer sequer uma única palavra. Ela dizia sempre que me amava, que estaria sempre comigo... E nem um telefonema, carta ou visita em sete longos anos. E agora, além de todo o sabor amargo que já tinha na boca pelas memórias que tinha dela, descobrira o doce que ela escondera.
Eu seria assim tão mau, para ela nem sequer me dizer que eu tinha uma filha? Será que ela a considerava assim um tão grande pecado que não queria que ela conhecesse o pai? Talvez para não se tornar no pobre exemplo de ser humano que ele se tornara…
Pois todos os esforços dela seriam em vão. Assim que saísse dali, eu ia procurá-la e não descansaria até que ela me deixasse ver a Wendy. Pelo menos ela saberia e, quem sabe talvez, se orgulharia de tudo o que o pai tinha feito para lhe tentar dar uma vida decente. Talvez ela me olhasse nos olhos. Talvez ela me dirigisse a palavra.
Talvez ela não me virasse as costas.

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Fanfic | Love Behind Betrayal

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Título: Love Behind Betrayal
Escrita por: #SahhChan & #NanamiUchiha


Dados do Projecto
Iniciado em: 01/01/2014
Finalizada em: -- CONGELADA --
Idioma: Português
Categorias: Anime & Mangá
Sub-Categorias: Fairy Tail
Personagens: Alzack Connell, Aries, Angel, Bisca Mulan, Brain, Charles, Cobra, Elfman Strauss, Erza Scarlet, Gajeel Redfox, Gray Fullbuster, Jellal Fernandes, Juvia Lockser, Cana Alberona, Levy McGarden, Lisanna Strauss, Loki, Lucy Heartfillia, Laxus Dreyar, Millianna, Mirajane Strauss, Natsu Dragneel, Wally, Wendy Marvell, Shou, Simon

Classificação: +18
Géneros: Drama, Hentai, Romance, Suspense, Universo Alternativo
Avisos: Drogas, Heterossexualidade, Linguagem Imprópria, Nudez, Sexo, Violência

Aviso Legal:
Os personagens encontrados nesta história não me pertencem, mas aos respectivos autores e criadores dos mesmos. Os eventuais personagens originais desta história são propriedade minha. História sem fins lucrativos criada de fã e para fã.

Notas da Autora:
Esta Fanfic está a ser escrita em Português de Portugal.
Está a ser postada num site do género (Nyah! Fanfiction), onde tenho um perfil público.
Todas as personagens usadas e/ou mencionadas, bem como parte da história usada na Fic, pertencem a Hiro Mashima, autor do Manga "Fairy Tail".


Sinopse:
Por vezes, boas intenções obrigam boas pessoas a trilhar maus caminhos. Por vezes, nem tudo o que não nos contam é somente para nos fazer sentir abandonados e sozinhos. Por vezes, aquele que pensas que mais te desamparou, é quem realmente sempre lá esteve para ti. Conseguirão o tempo e a solidão afastar as cortinas da verdade? Jellal está prestes a descobrir quem comanda a teia onde esteve enrolado durante anos.